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Armadilhas da linguagem: gerúndio

Marcos Chiquetto 3 maio 2023

O vestibular unificado das universidades estaduais de São Paulo, Fuvest, em 2005, formulou uma questão sobre o uso de gerúndio, da qual extraímos este trecho:

Quando a teleatendente diz: “O senhor pode estar aguardando na linha, que eu vou estar transferindo a sua ligação”, ela pensa que está falando bonito…

A questão aborda um modismo que se espalhou pelo Brasil nos últimos anos: o uso de gerúndio numa estrutura verbal composta em vez de simplesmente usar o verbo simples já no tempo correto. No exemplo acima, a atendente poderia dizer:

“O senhor pode aguardar na linha, que eu vou transferir a sua ligação”

Hoje, no Brasil, principalmente em conversas telefônicas de profissionais ou em vídeos divulgados no YouTube, é comum usar a locução verbal com gerúndio, prática que se tornou uma espécie de atestado de erudição. Mas, isso traz alguma vantagem na comunicação? Não; não há vantagem alguma. O verbo simples é tão eficiente quanto o composto nesses casos, e, por ser mais simples, é a melhor opção.

E de onde veio essa mania? Nós, que estamos dentro de uma agência de traduções, temos uma perspectiva que nos permite dar uma possível explicação para isso. Um dos trabalhos mais frequentes no nosso mercado tem sido a tradução dos chamados “scripts” de operadores de telefone, isto é, as frases que estas pessoas devem dizer quando conversam com os clientes de uma empresa ou usuários de um serviço. Nesses roteiros, originalmente escritos em inglês, ocorrem muito as estruturas compostas que são características daquele idioma:

“We will be calling you”

A tradução da frase acima é “Ligaremos para você”, já que essa é a estrutura verbal majoritariamente utilizada no Brasil, mas, muitos tradutores, no início, fizeram traduções literais como “Estaremos ligando para você”.

Esses scripts são as vozes oficiais de importantes empresas ou instituições, e acabam sendo vistos como modelos para o uso da linguagem. Daí as pessoas adotarem estruturas semelhantes em suas próprias comunicações telefônicas ou gravadas.

No entanto, esse modismo tem sido objeto de muitas críticas, e os tradutores hoje sabem que devem evitá-lo. Por isso, esse tipo de frase já não é comum no contexto do teleatendimento. O que sobrou mesmo foi o modismo que se espalhou como uma praga.

Bem, daqui para frente, estaremos evitando esse uso de gerúndio.

Ou simplesmente evitaremos?

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